sexta-feira, 29 de junho de 2007

V Encontro do Sub-Regional Leste II - Ritualidade e simbologia na liturgia

LITURGIA COMO AÇÃO SIMBÓLICA

Situação, hoje

•Nós últimos anos, está havendo um esforço para que a celebração litúrgica recupere a sua expressão simbólica mais autêntica.
•Nossa liturgia é muito verbalista, centrada no livro e na Palavra.
•Herança que recebemos do judaísmo, considerado a “religião do livro”. Ex.: Escuta, Israel (Dt 6,4) bem como a proibição de imagens.

Racional no culto

•Constamos que o racional e o discurso têm grande importância em nosso culto.
•Por outro lado, o visual e a expressão corporal significam muito pouco.
•No dia-a-dia a palavra é o primeiro sinal que empregamos para expressar idéias.
•Mas isso não basta para uma celebração que deve atingir e envolver o homem todo.

Vaticano II e a Palavra

•A reforma litúrgica do Concílio Vaticano II revalorizou a Palavra.
•Com isso, ela adquiriu ainda mais destaque.
•Mas ao mesmo tempo o aspecto simbólico empobreceu-se como a linguagem, o movimento e os sinais.

Críticas procedentes

•Contra isso, surgiram muitos protestos contra a excessiva simplificação dos elementos simbólicos por parte da nova liturgia. Muita falação. Muita munição. Muita oração sem presença das ações simbólicas.

Destruição do simbolismo


ØA. Lorenzer escreve contra os editores católicos na Feira de Frankfurt (1981) com o título: Congresso dos livreiros: a destruição do simbolismo.
ØNo livro sobre liturgia, lançado contra os livreiros católicos, acusa-os dizendo que destruíram a “significatividade” da liturgia.

ØA “ingenuidade profissional-celibatária” dos padres deste congresso substitui a linguagem altamente simbólica por uma “informação racionalizada”.

Ø Passou-se do culto sacramental e simbólico do Mistério para uma educação de predominância catequética, com a correspondente “sermonite”.





•Os jovens e a religiosidade popular constituem outros fatores que induzem a uma reconsideração da dinâmica interior da liturgia.
•Buscam maior expressividade dos sinais e da linguagem simbólica.

Volta aos símbolos


•Símbolos estão no coração da liturgia.
•Sem eles não é possível celebrar.
•Durante muitos anos, eles ficaram como que desvalorizados, mal entendidos.
•Hoje, há uma redescoberta do valor dos símbolos e uma busca de aprofundamento de seu sentido na celebração.

Por que gestos e símbolos na celebração?


•A liturgia é por si uma celebração na qual prevalece a linguagem dos símbolos.
•Uma linguagem mais intuitiva e afetiva, mais poética e gratuita.
•Não é só conceito nem tem como objetivo apenas dar a conhecer e descrever.

•A liturgia é uma ação, um conjunto de sinais “performativos” que nos introduzem na comunhão com o Mistério e nos fazem experimentá-lo, mais do que entendê-lo.
•É uma celebração memorial e não uma doutrina ou uma catequese.


Símbolo caminho para o Mistério


•É a linguagem simbólica que nos permite entrar em contato com o inacessível: o mistério da ação de Deus e da presença de Cristo.
•O mundo da liturgia não pertence às realidades que terminam em “-logia” (teologia, por exemplo), mas em urgia (dramaturgia, liturgia).


Liturgia é uma ação...

•Liturgia é uma ação, uma comunicação plena, feita de palavras, mas também de gestos, movimentos, símbolos, ação.
•Celebração litúrgica é o ato litúrgico e ação da assembléia reunida, obra da Igreja, que não se limita à contemplação, mas que ilustra os conteúdos numa ampla variedade de ritos que realizam tudo aquilo que é objeto da celebração.
•Celebrar é agir sob forma ritual.

Razão antropológica

•Existe uma razão antropológica neste apreço pelo sinal, rito e pelo símbolo.
•O homem é um ser constituído de tal maneira que realiza tudo a partir de seu espírito interior e de sua corporeidade:
•Não só alimenta sentimentos e idéias em seu interior, mas também os expressa exteriormente com palavras, gestos e atitudes.
•E isso não significa que o homem tenha sentimentos e, a seguir, simplesmente os expresse pedagogicamente, para que os demais sejam informados.
•Os sentimentos não são de todo humanos, nem completos, enquanto não forem expressos.
•Ou seja, a idéia, enquanto não se fizer palavra, não é realidade humana em sua plenitude.
•O homem não é uma dualidade “corpo e espírito”, mas uma unidade: é “corpo-espírito”, e é a partir de sua totalidade que se expressa e se realiza, com palavras e gestos.
•Então, na celebração litúrgica, o louvor não é plenamente nem humano nem cristão enquanto não soar na voz e no canto.
•Portanto, na ação ritual é necessário educar para o rito e estimular a compreensão do comportamento ritual.
•Não existe liturgia sem a ação ritual e simbólica.
•O sentimento de conversão e a resposta do perdão não se realizam de todo se não se manifestarem na esfera significativa:
•ou seja na esfera da Igreja, onde ressoa o “eu me acuso” e o “eu te absolvo”:
•uma ação sacramental, simbólica, significativa, que imprime o caráter de realidade no invisível e no íntimo que acontece entre Deus e o cristão.




Símbolo: categoria religiosa universal

•Símbolos e ações simbólicas são uma realidade universal. Nós as encontramos em todos os povos, em todas as culturas.
•Constituem uma forma de expressão e comunicação que ultrapassa a compreensão racional.
•Por isso, são capazes de dizer mais que simples palavras.
•Além de um grande número de símbolos, a quase cada página da Bíblia encontramos também sugestivas ações simbólicas como profecia.
•Estas últimas muito nos interessam para compreender melhor as ações simbólicas na liturgia.
•O homem se serve da linguagem simbólica, expressando e realizando com sinais e gestos corporais a comunhão religiosa com o Invisível,
•não só para sua própria expressão, ou para sua atividade social, mas também, e acima de tudo, para sua relação com a divindade.
•À primeira vista, trata-se de gestos simples e cotidianos: oferecer cafezinho, enviar uma flor, repartir o pão...
•Mas pelo processo de identificação, abrem caminho para a compreensão de um sentido mais amplo.
•Introduzem e nos fazem participar de uma realidade maior.
•A dinâmica dos sinais religiosos funciona de muitas maneiras: sacrifícios, palavras, cantos, objetos sagrados, ações, reverências, refeições, festas, templos...
•O sábado, para os judeus, é um símbolo que não só manifesta sua pertença ao povo eleito, mas também a alimenta e a realiza efetivamente.
•O gesto da imersão na água,
•tanto para os indianos no Ganges como para os egípcios no Nilo,
•tanto para os judeus no Jordão como para os cristãos no rito batismal,
•é um conjunto de ações e palavras que conformam uma celebração simbólica:
•a imersão em uma nova esfera. Em nosso caso: incorporação em Cristo, em sua nova vida, por meio da morte.

Sentido teológico dos sinais

•Para os cristãos o motivo fundamental dos sinais é o teológico.
•O melhor modelo de atuação simbólica é Jesus Cristo.
•Em sua própria pessoa, Ele é a linguagem mais expressiva de Deus, que quer nos mostrar a sua aliança, sua proximidade e seu perdão.

Sentido teológico


•Jesus está reunido com seus discípulos para a ceia pascal. Levanta-se da mesa, tira o manto, põe uma toalha na cintura.
•Depois, coloca água numa bacia, lava os pés dos discípulos e os enxuga com a toalha que traz na cintura...
•Ele faz o trabalho e sua o traje de um escravo.

•Jesus é o Senhor, mas à maneira de um servo, de alguém que presta serviço.
•É isso que Ele pede também dos seus: Se eu, o Mestre e Senhor, lavei seus pés, vocês também devem lavar os pés uns dos outros...
•No dia seguinte, Jesus morre crucificado, que era a forma aplicada aos escravos condenados à morte.

Sinais como pontos de encontro

•Túmulo vazio, encontros no jardim, na praia, em casa; discípulos reunidos, palavra, pão e vinho, peixe, marcas das chagas nos pés e nas mãos... Sinais. Pontos de encontro com o Ressuscitado.
•A partir destes sinais que a comunidade faz memória de Jesus, celebra o mistério pascal e organiza a sua liturgia.

Encontros de comunhão


•Na última ceia com seus discípulos, antes de sua morte, Jesus tomou o pão, tomou o cálice com vinho, deu graças, partiu e deu a seus discípulos, dizendo:
•Tomem e comam, tomem e bebam ... Isto é minha vida que entrego ao Pai, ao favor de vocês, para a salvação do mundo...
•Todos comem e bebem, e assim, se comprometem a continuar a mesma atitude de entrega do Mestre.
•No dia seguinte, o gesto de entrega total ao Pai se consuma na cruz: Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito...
•Todas as vezes que comemos do pão partilhado e bebemos do cálice, em memória de Jesus, o Espírito toma conta de nós e nos dispõe a seguir o caminho do mestre, confiando que o gesto de doação total, de amor incondicional, seja caminho de salvação para a humanidade inteira.
•O gesto cotidiano de sentar juntos à mesa, agradecer a Deus, comer e beber juntos, partilhar o alimento...,
•é assumido por Jesus para expressar todo o sentido profundo de sua vida doada por amor ao Pai e aos irmãos (1 Cor 11,23-26; Lc 22,14-20)

Sentido teológico dos sinais

•Cristo é a melhor linguagem da humanidade em sua resposta a Deus: nosso louvor e nossa fé permaneceram plasmados em Cristo, Cabeça da nova humanidade.
•Por isso, se diz que Cristo é o sacramento do encontro com Deus.
•São Paulo aos coríntios diz: Cristo é o “sim” mais claro de Deus aos homens e também o “sim” mais concreto dos homens a Deus.
•Cristo utilizou a linguagem dos gestos simbólicos em sua atividade salvadora: palavras, ações, contato de suas mãos, o seu olhar, os milagres...
•E continua a realizá-lo no sacramento global que se chama Igreja.
•Para nos proporcionar alimento e fortaleza pensou na ação simbólica do alimento eucarístico;
•Para fazermos nascer para uma nova vida, quer que recebamos o banho batismal da água...
•Por isso, a liturgia, tanto pelo sentido humano como pela teologia da encarnação, tem nos sinais e nos símbolos uma realidade fundamental como expressão e presença do Mistério e de comunhão com Ele.

Sinal e símbolo


•As celebrações precisam ser vistas na perspectiva dos símbolos ou melhor das ações simbólicas.
•Pois, o sinal aponta para algo exterior a si mesmo: fumaça indica existência de fogo; semáforo verde nos faz saber que já podemos passar...




SINAL

•O sinal não “é” o que significa, mas sim o que nos orienta, de um modo informativo para a coisa significada. É uma espécie de “mensagem” que designa ou representa outra realidade.

Ação simbólica

•A ação simbólica produz à sua maneira uma comunicação, uma aproximação.
•Tem poder de mediação, não só prática ou racional, mas de toda a pessoa e da realidade com a qual se relaciona.
•Para felicitar o aniversariante poderíamos só usar palavras, mas normalmente recorremos a uma linguagem simbólica: presentes, bolo, velas, canto do parabéns...

Alcance do Símbolo

•Símbolo (sym-ballo: re-unir; pôr junto duas partes de uma mesma coisa, que se achavam separadas) indica união e cria relação comunicativa.
•Ou seja, o símbolo estabelece identidade afetiva entre a pessoa e uma realidade profunda que não se consegue alcançar de outra maneira senão pela ação simbólica.
•Temos símbolos identificadores de grupos, de times, de partidos políticos ou mesmo agrupamento religioso.
•Tudo isso fica mais claro quando nós cristãs celebramos a liturgia.



Sentido do símbolo

•A imersão na água, no contexto batismal, adquire densidade muito grande: palavras, leituras, orações, fé dos presentes dão ao gesto simbólico, não só uma expressividade intencional, mas no fato sacramental,unem com eficácia à ação de Cristo, à fé da Igreja e à realidade da incorporação de um novo cristão à vida nova do Espírito.

Eficácia do símbolo


•Não é rito mágico que atua por si independente do contexto celebrativo.
•Não é apenas um gesto nominal ou meramente ilustrativo.
•A ação simbólica não é eficaz pelo modo físico ou metafórico, mas simplesmente pela eficácia que o símbolo possui.

Símbolo é relação de comunhão




•E assim acontece com todos os sacramentos e com as diversas celebrações do ano cristão, repleto de gestos simbólicos com os quais Cristo, a Igreja e cada cristão expressam e realizam sua mútua relação de comunhão.




Sentido espiritual

•Por isso, símbolos e ações simbólicas são sinais significativos que estabelecem uma comunicação, uma comunhão entre pessoas, para além da comunicação baseadas em idéias ou sentimentos.
•O bolo que se corta no aniversário e se come vem carregado de um significado que vai além das coisas materiais.

Símbolos realizam o que significam

•O bolo ou as flores expressam amizade, consideração, admiração, alegria.
•São eficazes: realizam aquilo que significam, fortalecem as relações entre as pessoas envolvidas.
•Impossível nos relacionar, impossível expressar nossa realidade profunda, nossa realidade mais íntima, sem usar símbolos e gestos simbólicos.

Símbolos com sinais do cotidiano

•Na celebração litúrgica, os símbolos e ações simbólicas se fazem com “sinais sensíveis” do nosso cotidiano, de nossa cultura, mas que vêem carregados de um significado relacionado com nossa fé.
•Sempre se referem àquilo que celebramos em todas as celebrações litúrgicas: O mistério Pascal de Cristo e nossa participação neste Mistério.

Símbolos são eficazes

•São eficazes: realizam o que significam (cf. SC 7).
•Na eucaristia: fazemos o que Jesus fez e mandou fazer:
•tomamos o pão e o vinho, damos graças, partimos o pão, comemos e bebemos.
•Trata-se de gestos humanos, cotidianos e culturais.


Símbolos sinais sensíveis mas que levam para além....

•São “sinais sensíveis”, coisas que podemos alcançar com nossos sentidos; coisas que podemos ver, ouvir, sentir, apalpar, cheirar... Coisas que passam pela nossa corporeidade.
•No entanto, referem-se a outra realidade que não está ao alcance de nossa sensibilidade nem mesmo de nossa racionalidade.

O mistério da doação


•O mistério da doação total de Jesus até a morte e sua glorificação por parte do Pai, expressas nas palavras que acompanham o gesto:
•isto é meu corpo que será entregue por vós..., este é o cálice do meu sangue... que será derramado... Eis o mistério da fé.

Símbolos são memória

•Aos repetirmos ritualmente os gestos e palavras de Jesus, o sentido a que se referem é ativado e atualizado.
•Somos identificados ao Cristo em seu rebaixamento e glorificação, em sua morte e ressurreição.
•Morremos e ressuscitamos com Ele. Livremente entregamos nossa vida ao Pai juntamente com a vida de Jesus. O Pai nos glorifica juntamente com seu Filho.
Nos símbolos o mistério pascal acontece para nós e em nós


•E o Mistério Pascal acontece para nós, em nós, dando sentido a toda a nossa vida enquanto cristãos.
•A ação simbólica expressa o sentido, manifesta a realidade mais profunda da experiência humana que se tornou patente na pessoa de Jesus, principalmente em sua morte na cruz.

Símbolo encontro com o Ressuscitado

•Então, o sinal litúrgico, a ação sacramental, não é um ato isolado do resto da vida, mas sua máxima expressão.
•O sacramento deixa de ser um “instrumento da graça” para se tornar um encontro, aqui e agora, com o Ressuscitado que, com seu Espírito transformador, renova a nossa vida.









Símbolo manifesta a dimensão sagrada da criação

•Deixa de ser um sinal “sagrado” separado do profano, para ser um sinal que manifesta a dimensão sagrada de toda a realidade criada.
•A capacidade simbólica do homem não consiste em dizer ou fazer certas coisas, mas em ver todas as coisas de uma determinada maneira: na sua “integração” global e significativa.